Jornalista português,
autor do livro "Beatles em Portugal"


Luis Pinheiro de Almeida (ou LPA, como é mais conhecido entre os amigos internautas), apesar de ser um dos mais respeitados jornalistas de Portugal, chegou na nossa lista de discussões apresentando-se apenas como "mais um beatlemaníaco". Isso aconteceu mais ou menos na época do falecimento de George Harrison, um período realmente triste na vida de todos nós. Mas com o tempo fomos descobrindo que o simpático português tinha muita informação roqueira, e estava disposto a dividi-las conosco. Com a sua chegada, nosso portal e lista de discussões ficou internacional. Passamos a ter uma visão européia da beatlemania e do próprio Rock'n'roll.

Hoje, alguns meses depois, temos o prazer de apresentar a toda a comunidade beatlemaníaca o mais novo filho desta nossa convivência transcontinental: o livro "Beatles em Portugal", de autoria de Luis Pinheiro de Almeida em parceria com Teresa Laje, diretora da maior rádio portuguesa. Neste exato momento "Beatles em Portugal" encontra-se nas máquinas tipográficas da editora Assírio. Em no máximo duas semanas estaremos com o livro em mãos. Mas todos nós podemos sentir o "gostinho" com esta entrevista (JC).


Como surgiu a ideia do livro "Beatles em Portugal"?
A ideia já germinava há longos anos, já estava na minha cabeça há quase 15 anos. Um amigo meu, meu mestre no jornalismo, Andrade Santos, logo a seguir à segunda entrevista a Paul McCartney, em 1989, meteu-me o "bichinho" na cabeça. 'Tens de escrever um livro sobre os Beatles. Só tu o podes fazer', insistia. Na altura, achei que não era ainda tempo, que era prematuro. Além dos compromissos profissionais que tinha, que não me deixavam tempo para mais nada, a ideia necessitava de ser mais amadurecida. E foi só depois de começar a participar na lista de discussões do portal Beatles Brasil, em Dezembro de 2001, que comecei a ver uma luz ao fundo do túnel. Por um lado, já tinha material suficiente para um livro minimamente interessante, por outro, Teresa Lage, produtora da RFM, a maior rádio portuguesa, também fã dos Beatles, associou-se ao projecto, completando, discordando, zangando-se, inovando e acrescentando o que me ia na cabeça. A cereja no topo do bolo foram os 40 anos da carreira dos Beatles. Com todos estes argumentos e com o "furo" de possuir a discografia portuguesa dos EPs, única no Mundo e que não foi nunca publicada, fácil foi arranjar editora para o livro, a Assírio & Alvim, uma das mais prestigiadas de Portugal.

Antes de lançar o livro "Beatles em Portugal", você já era responsável pelas atualizações de uma coluna no portal Beatles Brasil, com nome homônimo. Como tem sido a experiência de lidar com o público brasileiro?
É bondade da sua parte considerar-me responsável pela actualização da coluna. Na verdade, desde que começou a sério a história deste livro, no início deste ano, a minha participação no portal tem sido zero, pelo que me penitencio. Verdade seja dita também, que a matéria a que estou adstrito é físicamente limitada. Depois de tudo dito, nada mais há a dizer. Quanto ao público brasileiro, tem sido igualmente muito gentil e benevolente para comigo. É um público muito difícil, porque muito exigente e muito sabedor dos Beatles. Surpreende-me até o nível dos brasileiros nesta matéria. Em Portugal não se sabe nada dos Beatles. Eu, por saber uma meia dúzia de coisas sobre os Beatles já sou considerado em Portugal um "perito". Os portugueses haviam de conhecer os brasileiros. Neste aspecto, não me dou muita importância a mim próprio.


O autor no iate dos Beatles, no Funchal (Ilha da Madeira)


Você já esteve no Brasil?
Sim, em 1976, numa visita de Ramalho Eanes, então Presidente da República de Portugal. Estive no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Brasília. No que à música diz respeito, tenho até um episódio deveras curioso. Devido aos meus afazeres profissionais, não tinha tempo para andar nas discotecas (lojas de discos) à procura de discos. Em São Paulo, na sala de imprensa, como tínhamos hospedeiras ao nosso serviço, pedi a uma que me comprasse o disco que estivesse na berra. A amável assistente comprou-me um disco de Roberto Leal, que eu nem sabia quem era. Vim a saber mais tarde que Roberto Leal era um português radicado no Brasil e quando o conheci contei-lhe a história e, claro, pedi que me autografasse o disco. Lembro-me também de ter ido ao bar de Ivon Curi, que era um dos meus ídolos de meninice.

O que você espera desse livro "Beatles em Portugal"?
Confesso que escrevi o livro para mim. Se as pessoas gostarem dele tanto como eu gosto, claro que fico satisfeiro.



E quanto à editora Assírio, o que há a comentar?
É uma honra para mim editar na Assírio. A Assírio & Alvim é uma das mais prestigiadas editoras portuguesas. Basta citar, entre outras referências, que tem os direitos mundiais da obra de Fernando Pessoa e Mário Sá-Carneiro, dois dos maiores poetas de língua portuguesa, além de Mário Cesariny, o maior expoente do surrealismo português, Ruy Belo, outro grande nome da poesia portuguesa. Acresce o facto de o próprio proprietário da editora, Manuel Rosa, artista plástico e escultor de renome no meu país, se ter empenhado pessoalmente na edição deste livro. Foi gratificante e honroso vê-lo ao computador a paginar o livro com as suas ideias fantásticas de, em termos de grafismo, fazer o livro. Não delegou em ninguém.

Sendo Portugal um país tão próximo à Inglaterra, porque nunca houve uma apresentação da banda em terras portuguesas?
Como se explica no livro, na altura dos Beatles, 1962-1970, Portugal vivia numa feroz ditadura de direita, primeiro com Salazar, depois com Marcello Caetano, que viria a morrer exilado no Brasil. Nesses anos, Portugal protagonizava uma injusta guerra colonial nas suas possessões ultramarinas. O país era pobre e atrasado. Os Beatles, como porta-vozes de uma juventude revolucionária, eram malquistos em Portugal. Mesmo que a censura política permitisse uma apresentação deles em Lisboa, as limitações de ordem económica e financeira impediriam essa apresentação. Todos os recursos financeiros disponíveis eram dispendidos na guerra colonial, que consumia também a juventude.



A capa do livro "Beatles em Portugal", de primeiríssima mão, mais uma montagem com fotos dos co-autores (Luis Pinheiro de Almeida e Teresa Lage) com George Martin, Ringo Starr e Paul McCartney.


Você já esteve com algum Beatle pessoalmente?
Com todos eles, mas separadamente. Entrevistei duas vezes Paul McCartney e encontrei-me com ele diversas outras vezes em conferências de imprensa. Entrevistei uma vez Ringo Starr e estive com ele também em outras conferências de imprensa ("colectivas", como chamam os brasileiros). Estive uma vez com George Harrison, mas não consegui chegar à fala com ele, embora tivesse tentado. Foi numa apresentação privada de um disco de Gary Moore, em Londres, em 1992. E vi também o último concerto dele ao vivo. Assisti também a um concerto de John Lennon em 1970, em Londres, num festival anti-nuclear. Aqui não se pode dizer que estive com ele pessoalmente.

E fora do circuito Beatle, que outros astros do rock você já teve a oportunidade de encontrar e/ou entrevistar?
Não muitos. Lembro-me, de repente, de Noel Gallagher (Oasis), Phil Collins, Crispian Mills (Kula Skaker, agora Jeevas), Pulp, Celine Dion (ah! ah! ah!), Gene, Charlie Watts e Ron Wood (dos Rolling Stones), Bryan Ferry, David Grohl (Nirvana, Foo Fighters), Simple Minds, Icicle Works, Ugly Kid Joe, Donovan, Lamb, Bono, Michael Stipe, David Gilmour, Zeca Baleiro, fora os portugueses. Não ligo muito a isso.

Como coleccionador que é, seria possível fazer um balanço do relicário que possuis em casa? Quais os teus itens mais valiosos/raros/favoritos?
Não sou um coleccionador. Sou antes um "guardador". Com isto quero dizer que não ando em feiras a comprar coisas atrasadas, sabe-se lá se autênticas, ou a fazer lances em leilões mais ou menos duvidosos. Gosto de ter as coisas na altura própria e guardá-las. Daí que 95 por cento do que tenho foi arranjado na altura própria, em primeira mão, e guardado. Os meus itens mais valiosos? Todos! Ainda não há muito discorria na lista do portal Beatles Brasil uma discussão sobre os desenhos em cartão que estavam incluídos no "Sgt. Pepper's". Quase toda a gente confessava que tinha recortado os bonecos e divertido imenso com isso. Pois eu não, os meus bonecos estão intactos. Há brasileiros meus amigos da lista que gozam comigo, porque mantenho uma "Antologia", em livro, ainda dentro do plástico ou também, por exemplo, o "1", em vinil, também no plástico. Conheço gente que dorme com o livro ou me chama "marado dos cornos" por não abrir o vinil. Eu comprei dois livros, um para ler, outro, para guardar dentro do plástico. Quanto ao disco, ouço em CD e guardo religiosamente o vinil. Daqui a 20, 30, 40 anos, se ainda cá estiver, falaremos. Mas se insiste na pergunta, destaco os discos flexíveis que os Beatles ofereciam todos os Natais aos fãs.

É verdade que você já se negou a dar de presente um disco raro dos Beatles ao Paul McCartney? Que história é essa?
É verdade, sim. Em 1987, quando da primeira entrevista que fiz a Paul McCartney, apresentei-lhe para autografar um dos tais discos flexíveis de Natal dos Beatles. Tratava-se de "Pantomine", que tem uma capa desenhada pelo próprio Paul. Ele disse que não tinha o disco - o que não acreditei - e se eu lho oferecia. Obviamente disse que não! O que é meu é meu e não dou a mais ninguém. Se eu lhe pedisse o "In Spite" ele também não mo dava.

Você tem um conhecimento privilegiado da música brasileira - maior até que muitos brasileiros. Poderia citar o que tem encontrado de mais interessante nos seus investimentos em CDs de artistas nacionais?
Uma vez mais você me lisonjeia. Eu só conheço uma ínfima parte do que o Brasil produz em matéria de música. Só conheço o que as multinacionais deixam atravessar o Atlântico e mais uma ou outra coisa. Além dos clássicos - Caetano, Chico, Gal, Gil, Jobim e por aí fora -, tenho uma grande "devoção" por Zeca Baleiro que conheci em Lisboa. É deveras talentoso! Sei que o Brasil tem uma rica produção no registo hip-hop, mas aí, confesso, não é a minha onda.

Love, Vine and Rock'n'Roll: Luis Pinheiro de Almeida e sua eterna namorada Teresa Lage, num intervalo da "escrevinhança" do livro, nas vindimas portuguesas.


É conhecido que você não gosta de bandas cover dos Beatles, mas é um grande coleccionador de versões de músicas dos Beatles. Não lhe parece um pouco conflitante? Existem bandas cover em Portugal?
Como nós popularmente dizemos em Portugal o "cú não tem a ver com as calças". Ou seja, uma coisa são as "bandas cover", outra são as versões dos Beatles por outros artistas. Quer convencer-me que é a mesma coisa, por exemplo, ouvir "Help!" por uma qualquer Beatles Cover Band ou pelos U2? Para mim, uma "banda cover" assemelha-se a beber uma cerveja sem álcool ou a comer um pão com margarina, em ves de manteiga. Uma versão por outro artista tem outro sabor, o sabor da interpretação que o próprio artista empresta às geniais criações dos Beatles. Mal por mal, prefiro os Rutles. Não, não existem "bandas cover" em Portugal. Há sim, bandas amadoras que tocam em bares, casamentos, baptizados, aniversários (e, se calhar, funerais) que tocam "covers" de toda a gente, não só dos Beatles. "A Whiter Shade Of Pale" deve ser o "must". Em Portugal não há essa tradição dessas "bandas cover".

Há alguém que você ainda gostaria de entrevistar ou algum disco que pretenda possuir?
Disco, penso que não. Passe a imodéstia, acho que tenho tudo o que quero, a não ser, talvez, algum "pirata" que tenha o concerto dos Oasis com Burt Bacharach. Quanto a entrevistas, a história é diferente. Não sou adepto de entrevistas, pelo menos nos moldes por que são vistas pela indústria discográfica. Prefiro "conversas" a entrevistas". Se hoje eu quiser, por exemplo, uma entrevista com Elton John, a editora responde-me que "não é oportuno" que "não há disco a promover", por isso a entrevista não é viável. É contra isso que eu me revolto. Também me recuso ao chamado sistema "phoners", que são as entrevistas pelo telefone. Nunca se sabe quem está do outro lado da linha. Para responder directamente à sua pergunta, gostaria muito de falar (não entrevistar) com Neil Young e Bob Dylan, dois dos meus heróis.









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