Reviews
George Harrison
The Dark Horse Years
1976 - 1992

Por Gustavo Montenegro

Finalmente chega ao Brasil o tão aguardado Box Set de George Harrison, disponível no exterior desde finais de fevereiro. Cobrindo o período em que o Beatle lançou trabalhos por seu próprio selo, "The Dark Horse Years 1976 - 1992" prova ser mais um belo item para os fãs do guitarrista. A luxuosa caixa apresenta os 6 álbuns que Harrison gravou antes de seu período de retiro, e mais um belíssimo DVD bônus com imagens nunca lançadas oficialmente.



Os discos, antes pertencentes ao catálogo da gravadora Warner, estavam fora de catálogo há vários anos, e agora ressurgem remasterizados e renovados via EMI. A qualidade é primorosa. O ao vivo "Live In Japan", gravado na turnê que Harrison fez com Eric Clapton em 91, volta em formato SACD (Super Áudio CD), para o deleite dos audiófilos de plantão. Além do upgrade sonoro, a parte gráfica de todo o material também é um show a parte. Com exceção de "Gone Troppo", todos os discos ganharam novos e elaborados encartes, com fotos exclusivas e comentários extraídos da autobiografia de Harrison, "I Me Mine". O álbum "Somewhere In England" é o exemplo mais notável, já que teve toda sua arte modificada, apresentando o projeto de capa originalmente idealizado por George, mas vetado pela Warner na época de seu lançamento.

Outro destaque são as faixas bônus que complementam os álbuns. Embora tenham gerado uma certa indignação entre os fãs, devido a sua pouca quantidade, percebe-se que elas estão lá mais como um aperitivo do que como chamariz. Basicamente compostas por demos, elas certamente são uma pequena amostra do que vem por aí. O fã acostumado com o material bootleg de Harrison sabe que existem faixas muito melhores guardadas nos arquivos de Henley-On-Thames, como certas músicas que tiveram seu lançamento oficial em tiragens muito limitadas. "Sat Singing" e "Flying Hour", ambas presentes no raro "Songs By George Harrison", são alguns exemplos. Mas isso não significa que as músicas extras sejam ruins. A demo de "Here Comes The Moon", presente em "George Harrison", vem num clima bastante intimista, numa combinação entre violão e voz que chega a causar arrepios.

O que realmente faz falta são três canções antes incluídas na coletânea "The Best of Dark Horse", há muito fora de catálogo, mas lançada em CD inclusive no Brasil. São elas "Poor Little Girl", "Cockamanie Bussiness" e "Cheer Down", esta última presente também na trilha de "Máquina Mortífera 2". Todas as três eram esperadas neste Box Set, já que encontrar a compilação se tornou uma tarefa das mais duras. Infelizmente apenas "Cheer Down" aparece na caixa, em uma versão ao vivo incluída em "Live In Japan". Uma pena.



Um luxo para poucos

Contrariando todas as expectativas, os que aguardaram por esta importação da gravadora EMI-Brasil acabaram tomando um grande susto. Em recente cotação realizada pelo portal Beatles Brasil, o preço da caixa ficou entre R$550,00 e R$670,00 nas principais lojas da Internet. Quem optou por encomendar o item nas importadoras especializadas pagou quantias menos salgadas, números que variam entre R$450,00 e R$500,00. Contatada por e-mail, a EMI-Brasil não se pronunciou sobre a caixa, limitando-se, apenas, a anunciá-la sem muito destaque em seu site oficial.

O fato mais intrigante é que a mesma EMI-Brasil importou recentemente um lote do Box Set dos Beatles, disponibilizando-o com exclusividade na SomLivre.com. A caixa, tão ou mais luxuosa que a de Harrison, vem com 15 CDs que abrangem todo o material gravado pela banda. Mesmo assim, o preço cobrado pela loja foi de R$450,00 e o estoque foi esgotado em pouco tempo. Então qual a razão deste preço absurdo? A presença de um SACD? Fica aqui o espaço aberto para quem souber responder esta questão.



O DVD

O grande atrativo desta coleção, sem sombra de dúvida, é o DVD bônus especial. Recheado de belas imagens, o conteúdo é dividido em quatro segmentos. No primeiro, Harrison é mostrado falando sobre a Dark Horse Records e sua carreira a partir de 1976, em entrevistas intercaladas com cenas de clips e apresentações ao vivo. Em seguida temos a melhor parte do programa, onde são apresentados os clips de "This Song", "Crackerbox Palace", "Faster", duas versões de "Got My Mind Set On You", "When We Was Fab" e "This Is Love", todos devidamente comentados. Para quem estava acostumado a assistir estes vídeos apenas via pirataria, a qualidade de imagem som impressiona. O único ponto negativo desta parte, e provavelmente de todo o DVD, é a falta dos vídeos de "All Those Years Ago", "Blow Away" e "True Love", que caberiam muito bem nesta compilação.

O próximo segmento é dedicado aos shows da turnê japonesa em 1991. Daí temos "Cheer Down, "Cloud Nine", "Devil's Radio" e "Taxman", que mostram um George Harrison em plena forma, fazendo solos de slide fantásticos ao lado do parceiro Eric Clapton. Neste ponto, mais uma vez, fica evidente que esta caixa é só uma amostra do que Olivia e Dhani têm guardado para nós. Com uma qualidade excelente, é praticamente certo que ainda teremos um lançamento oficial e completo deste show em DVD.

A quarta e última parte traz um material interessante, mas que talvez estivesse melhor em um lançamento do tipo "Anthology". São três clips extraídos do making of do filme "Shangai Surprise", estrelado por Madonna e Sean Penn, produzido pela Handmade Filmes. Aqui George mostra a fraca música-título, ao lado da belíssima "Someplace Else" e da ótima "Hottest Gong in Town". De quebra temos imagens da rápida aparição do Beatle no filme.





Harrison inspirado

Muita gente questiona a qualidade de alguns discos da era Dark Horse, alegando que eles não estariam à altura dos trabalhos lançados pela Apple. Trata-se de um argumento até certo ponto compreensível, já que a obra-prima de Harrison, "All Things Must Pass", o melhor álbum solo já lançado por um ex-Beatle, saiu pelo selo da maçã. Acontece que os discos do período abordado pelo Box Set apresentam um George Harrison mais amadurecido, um pouco mais pop, talvez até menos místico, mas ainda assim inspirado.

O ótimo "Thirty Three and 1/3" (76) traz pérolas como "This Song", onde George mostra toda sua ironia e bom humor ao tratar do caso de plágio envolvendo "My Sweet Lord", "Beautiful Girl", um dos melhores exemplos de simplicidade e ternura numa só canção, e "True Love", cover do gênio Cole Porter.

"George Harrison" (79) é um disco memorável, talvez o melhor desde ATMP, e que traz pelo menos 3 clássicos. "Love Comes To Everyone", uma música linda que mostra como George conseguia ser romântico sem ser banal, a empolgante "Faster", uma declaração de amor à Fórmula Um, e "Blow Away", que traz um som de slide inconfundível, como só ele sabia fazer. O disco tem ainda a bela "Dark Sweet Lady", feita para sua esposa Olivia, além de uma canção resgatada do tempo dos Beatles, "Not Guilty".

"Somewhere In England" (81) não chega a ser tão bom quanto os dois anteriores, mas nem por isso desagrada. Além de trazer um dos maiores sucessos de George, a homenagem ao amigo John Lennon em "All Those Years Ago", mostra o guitarrista derramando seu veneno sobre a indústria fonográfica em "Blood From a Clone". Outro grande momento do disco está em "Life Itself", onde ele mais uma vez expõe sua fé em versos como "You are the One, no matter what, you are the real love that I've got".

"Gone Troppo" (82) é considerado por muitos como o mais fraco dos trabalhos de Harrison. Apesar de ser extremamente bem produzido, o disco soa datado e como um todo realmente fica devendo. Os bons momentos ficam na instrumental "Greece", na divertida "Really Love You" e em "That's The Way It Goes", que chegou a ser incluída no set list do tributo "Concert For George". Uma das melhores bônus tracks está incluída neste CD, já que a versão demo de "Mystical One" consegue ser melhor que a original.

George volta à boa forma com "Cloud Nine" (87), outro de seus melhores trabalhos. Gravado com um elenco de estrelas, este disco marca o início da parceria com o produtor Jeff Lynne, que mais tarde seria um dos Travelling Wilburys. É provável que seja o álbum mais pop de sua carreira, recheado com músicas de altíssimo nível como "When We Was Fab" (uma saudosa brincadeira com o tempo dos Beatles), "Fish On The Sand", a balada "Someplace Else", e o grande sucesso "Got My Mind Set On You", música que o levou de volta ao topo das paradas.

"Live In Japan" (92), como todo disco ao vivo, desperta as mais variadas opiniões nos ouvintes, raramente sendo unanimidade. Um ponto a favor é que ao contrário dos discos ao vivo de Paul McCartney, onde 80% do repertório é composto de canções dos Beatles, "Live In Japan" consegue mesclar bem as músicas da carreira-solo com aquelas lançadas nos anos 60.



Boicote

Neste ponto o fã se pergunta: "Já deu pra notar que a caixa é ótima, mas vale a pena pagar uma quantia astronômica por ela?" A resposta é não. O material é de excelente qualidade e o item é indispensável na estante de qualquer fã de George Harrison, mas o preço que está sendo cobrado é irreal. Olivia e Dhani estão de parabéns pelo trabalho que fizeram, já que a grande vilã é mesmo a EMI-Brasil. O que a gravadora está fazendo é limitar o acesso a este Box Set apenas para alguns poucos privilegiados. Mesmo aqueles mais endinheirados estão boicotando o lançamento por se sentirem lesados. A melhor alternativa é esperar, pois certamente a caixa vai encalhar nos estoques, obrigando uma queda nos preços. Não é por acaso que cópias piratas do DVD já estão sendo encontradas por R$75,00 no mercado alternativo. Uma consequência inevitável.









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