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"Acústico" de John Lennon é uma grata surpresa


Marcelo Fróes

Quando o lançamento do "Acoustic" de John Lennon foi anunciado num site japonês e imediatamente espalhado mundo afora, a primeira reação foi de descrédito. Seria mais um pirata montado a partir das inúmeras gravações liberadas por Yoko Ono em 1988, quando a série radiofônica "The Lost Lennon Tapes" fez a alegria dos pirateiros e, claro, dos fãs e colecionadores.

Lançado no Japão em 29 de setembro último, "Acoustic" não pretendia ser um produto mundial da EMI. Produzido por Yoko Ono, com o auxílio luxuoso do engenheiro de som Rob Stevens, com quem a viúva vem trabalhando há alguns anos, este CD unplugged de John Lennon acaba sendo uma grata surpresa. A bela edição japonesa, com direito a uma palheta de brinde, traz no encarte fotos, letras e cifras para violão. Em seu costumeiramente breve texto, Yoko declara: "Dedico este disco aos futuros guitarristas. John sempre tocou com o coração. Espero que vocês aprendam a fazer o mesmo".

Temia-se que o "Acoustic" fosse montado com demos caseiras, famosas pelo despojamento de Lennon nas performances – notadamente nas demos das faixas gravadas no último álbum, depois do violão ter passado cinco anos debaixo da cama. Apesar da ficha técnica nada informar acerca da origem das gravações, identifica-se facilmente a origem dos fonogramas e é uma feliz descoberta verificar que as quatro primeiras faixas são out-takes acústicos do LP "Plastic Ono Band", gravado no estúdio da Abbey Road em 1970. Destaque para Love, com John cantando e tocando violão antes da adição posterior do piano de Billy Preston. Muita coisa parece idêntico ao que está na caixa "Anthology" de 1998, bem mais do que as admitidas faixas não-inéditas. Há também a desnecessária My Mummy's Dead, curta demais e aparentemente idêntica à incluída no "Plastic Ono Band" (não me peçam pra comparar, pois existem dois takes gêmeos).

A demo de Cold Turkey, também distorcida, é um presente tão legal quanto duas das quatro performances no "John Sinclair Freedom Rally" de 1971: The Luck Of The Irish e John Sinclair, em estéreo. Estas duas e Sisters O Sisters e Attica State teriam saído num compacto duplo da Apple no início de 1972, mas John acabou encontrando a Elephant's Memory e decidindo por gravar um álbum de estúdio. Attica State já havia saído na caixa de 1998, então agora só falta Sisters O Sisters (de Yoko, diga-se). Estranho que Yoko assine a produção do disco sozinha, quando diversas das faixas foram efetivamente produzidas originalmente por John Lennon.

Woman Is The Nigger Of The World entra numa pão-duresca demo de 42 segundos, quando Yoko certamente poderia Ter escolhido outra mais longa, mas a decepção é compensada por uma demo de What You Got que é mais extensa que a da caixa de 98 e que nos permite conhecer versos alternativos para a letra. Watching The Wheels e Dear Yoko entram em demos acústicas, da mesma forma como Real Love – já lançada, (creio que) em outros takes, tanto no CD "Imagine" (88) quanto na caixa "Anthology" (88). Imagine também comparece na versão acústica do Apollo Theatre de 71 e o disco fecha com a instrumental It's Real, sem letra porém com a melodia assobiada por Lennon (ainda sem letra pra cantar), e previamente escondidinha na caixa de 98.

"Acoustic" não é nenhuma Brastemp, mas é um belo presente. Só é preocupante pois, em tempos de falta de grandes artistas para gravar novos "Unplugged", pode alguém ver no formato modelo para uma série do tipo "Necro Acoustic" – com demos, bases, ensaios e performances acústicas servindo para compilações comercialmente interessantes sob a égide dos milionários "acústicos" que assolam a indústria.









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