Reviews
Paul McCartney
Chaos and Creation in the Backyard



O quintal criativo de Paul McCartney



Por Gustavo Montenegro

Durante um breve período, a qualidade dos discos de Paul McCartney foi caindo. De "Pipes of Peace" (1983) a "Off The Ground" (1993), são vários os exemplos de faixas isoladas que trazem a genialidade do beatle. Mas os álbums em si, como um todo, não eram lá grande coisa. Isso durou até 1997, quando o mundo ouviu o belo "Flaming Pie", gerado em meio ao turbulento período pelo qual Paul passava. Na época, sua esposa Linda já se encontrava nos últimos momentos da batalha contra o câncer que a matou no ano seguinte. De lá pra cá a carreira do Macca ganhou novos ares, e aí o homem só lançou coisa boa. Seu novo álbum "Chaos and Creation in The Back Yard" é mais uma prova disso.

Gravado num período de dois anos e produzido por Nigel Godrich, o disco alterna momentos de introspecção e de liberdade. A introspecção surge quando se nota o predomínio do trabalho de Godrich na música, marcado sempre por um clima carregado, de sons não convencionais e arranjos que lembram seus trabalhos com o Radiohead. Já a liberdade vem à tona nas faixas em que a mão de McCartney se mostra mais presente, com melodias inspiradas e arranjos que lembram os Beatles. O saldo da combinação é bastante positivo.

A escolha para o single de estréia não poderia ser diferente, já que Fine Line é disparada a mais comercial do disco. Lembra muito o som do supracitado "Flaming Pie" e é um excelente power pop. O clima fica mais pesado na faixa seguinte, How Kind Of You, que é o primeiro exemplo do trabalho do competente produtor. Traz a voz de Paul sobre uma base caótica, com um piano inquieto que passeia ao longo da música inteira. Uma faixa muito interessante, que merece ser ouvida com atenção. Logo após temos Jenny Wren, forte candidata à preferida da audiência. É uma canção delicada, com uma melodia cativante, tocada num violão que lembra muito Mother's Nature Son, embora Paul insista em considerá-la uma "filha de Blackbird".

At The Mercy é daquelas que causam estranheza no início, talvez por culpa de sua estrutura incomum, em se tratando de Paul McCartney. Embora uma segunda audição já revele uma harmonia bem trabalhada, a faixa vai demorar a conquistar os fãs mais ortodoxos. Depois dela chega Friends To Go, que pode muito bem sair como single no futuro. Paul disse que sentiu a presença de George Harrison na hora de compor. Verdade ou não, nunca vamos saber, mas a música é muito boa e realmente tem alguns elementos que lembram o guitarrista dos Beatles. Essa é daquelas pra se ouvir várias vezes. English Tea, a faixa seguinte, tem uma melodia que gruda no ouvido e que lembra os Rutles, por mais irônico que isso possa ser. Quem entende do assunto sabe que é um elogio.

Too Much Rain, outra forte candidata ao próximo single, é uma música simples, levada no violão, de letra otimista e muito bem arranjada. Essa certamente vai agradar aos fãs mais antigos, acostumados ao som mais tradicional do baixista. Uma grande surpresa é A Certain Softness, um bolerão de clima latino que nos faz lembrar do excelente crooner de cabaré que existe em McCartney. Perfeita para quem curte Till There Was You e P.S. I Love You. A mão de Godrich pesa outra vez em Riding To Vanity Fair, uma faixa lenta, marcada por um arranjo peculiar. É outra que merece ser ouvida com atenção, já que foge do convencional e pode surpreender muita gente. Follow Me não está muito diferente do que foi mostrado no show em Glastonbury, por isso não causa surpresa. Mas Promise To You Girl, na seqüência, é uma das melhores músicas de Paul nos últimos anos. Começa numa levada beatle e logo irrompe num ritmo contagiante, com harmonias que remetem a Brian Wilson e trechos que lembram muito os tempos do Wings.

Fechando o disco temos duas lindas baladas, This Never Happened Before e Anyway. A primeira é nada mais que uma love song típica do Paul, daquelas que conquistam na primeira audição. A segunda traz uma melodia mais elaborada, um pouco diferente do habitual, e é de uma beleza singular. A letra repete alguns elementos de Only Love Remains, o que conta um ponto negativo, mas não chega a comprometer a canção. Para o final, Paul escondeu uma faixa surpresa, de nome I've Only Got Two Hands, toda instrumental. Essa é outra que me deixou com uma pontinha de Wings na cabeça. Quem é fã vai entender.









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