Reviews
Yoko Ono
Yes, I'm a Witch



Luís Pinheiro de Almeida

Não deixa de ser curioso que a canção mais estapafúrdia do novo álbum de Yoko Ono, "Yes, I'm A Witch", seja, ironicamente, a única que tem a assinatura de John Lennon. Desde o assassínio de Lennon, em 1980, que Yoko Ono tem sido o alvo letal predilecto de auto-intitulados fãs dos Beatles. Com Lennon vivo, poucos porém se atreveram a escrever uma linha que fosse contra a artista japonesa. Isso tinha um significado: respeito! Se Lennon trocou a sua vida burguesa em casa por uma aventura (perigosa) em Nova Iorque, alguma razão tinha e essa razão chamava-se Yoko Ono. E ninguém piava ou piou!

Os fãs dos Beatles - pelo menos gostam de assim ser intitulados - nunca aceitaram o fim natural da banda em 1970, ao contrário dos próprios protagonistas que assim o decidiram. E arranjaram um bode expiatório: Yoko Ono. E toca de insultar e injuriar! "A culpa é da Yoko", clamou um dia Lloyd Cole e a frase venceu. O cliché assumiu foros de cool e toda a gente o brandia por tudo e por nada. A própria Yoko se deixasse queimar a torrada na cozinha provavelmente também diria "a culpa é da Yoko".

Todo este intróito serve para invectivar a cegueira de "fãs" dos Beatles quando confrontados com "Yes, I'm A Witch". Nem sequer admitem ouvir o disco sem preconceitos. Muitíssimo mais corajosa e clarividente foi a própria Yoko ao sarcasticamente escolher este título para a sua nova aventura.

Criticar o que quer que seja é um acto sério, responsável. Não se parte para ele com ideias pré-concebidas, com ideias feitas. Se assim fôr, então é mais honesto ficar calado e deixar o marfim correr. Teorizar com o pré-aviso de que "se sentiu obrigado a ouvir" é - lamento - ludibriar o destinatário da mensagem.

Ouvir "Yes, I'm A Witch" já com a pré-disposição de que a "bruxa" só sabe "guinchar", com a pré-disposição de que se não fosse ela, os Beatles (incluindo George Harrison) estariam ainda hoje em cima de um palco é um crime, é uma desonestidade intelectual. É como testemunhar que tudo o que Paul McCartney faz é bom e/ou excelente (que é o que estatuem os anti-Yoko). Provavelmente, também secundam a pretensão espúria de Paul pretender a assinatura invertida de "Yesterday". Se Paul McCartney fosse tão bom gestor de carreira quanto Yoko Ono tem provado ser e certamente os seus fãs seriam hoje bem mais felizes.

Dito isto, não significa que "Yes, I'm A Witch" seja candidato ao melhor disco do ano! Não é nada disso que se trata! Mas é um projecto que, no mínimo, exige uma atitude honesta de descomprometimento, de avaliação imparcial. Não é impunemente que nomes alternativos de prestígio da cena norte-americana arriscariam a sua imagem e a sua carreira ao aceitar reinventar Yoko Ono. Estou a lembrar-me dos Flaming Lips, Peaches, Le Tigre, Porcupine Tree, Apples In Stereo, Cat Power ou até ingleses como Antony ou Jason Pierce.

Como diz um insuspeito e credenciado crítico português, Mário Lopes, "todos (os atrás citados e outros) mergulharam nas canções da sra Lennon para mostrar que a "bruxa" é "cool" e é talentosa, para mostrar que, se não a perceberam antes, agora é o tempo de a celebrar". A minha aposta é que os verdadeiros fãs dos Beatles vão saltar em "Yes, I'm A Witch" a faixa de John Lennon, "Cambridge 1969/2007". E digo mais! Ouve-se muito melhor "Yes, I'm A Witch" do que alguns discos de Paul McCartney e com isso assino (para alguns talibãs) a minha sentença de morte. Mas sobreviverei!








Free Web Hosting