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Yeah! Yeah! Yeah!

Fonte: The Observer
Tradução: Gustavo Montenegro

Já faz 40 anos desde que os Beatles, na esteira de seu primeiro grande sucesso nos Estados Unidos, voaram até Nova York para uma viagem que mudaria o curso da década de 60. Conheça agora a história completa das duas semanas que enlouqueceram a América, contada pela própria banda, sua equipe, fãs e figurões do show business americano.


Aeroporto Heathrow. Centenas de adolescentes gritando "welcome home" para os Beatles após sua primeira turnê pela Suécia. Esta cena, ocorrida em 31 de outubro de 1963, foi testemunhada por um apresentador de TV americano, Ed Sullivan, que estava de pasagem.

Ed Sullivan: Aquela foi a maior multidão que eu havia visto na vida. Eu perguntei para alguém o que estava acontecendo e ele disse "São os Beatles". "Que diabos são os Beatles?", eu perguntei. Mas quando voltei ao hotel, conseguí descobrir o nome do empresário deles e marquei para que fissezem três apresentações. Quando voltei pra casa, descobrí que apenas eu e minha esposa Sylvia éramos as únicas pessoas no país que não sabiam quem eram os Beatles. Fiquei bastante preocupado.

George Martin: Era muito difícil em 1963 pensar que os Beatles durariam para sempre e que eu estaria falando sobre eles após 40 anos. Eles lançaram quatro singles naquele ano: "Please Please Me", "From Me To You", "She Loves You" e "I Want To Hold Your Hand". Na medida em que eram gravados, eu enviava cada um deles para meus amigos da Capitol Records na América, dizendo: "Este grupo é fantástico; vocês têm que vendê-los nos Estados Unidos". E em todas as vezes, o responsável da Capitol apenas dizia: "Sinto muito, mas conhecemos nosso mercado melhor do que vocês e não achamos que eles sejam realmente bons".

A Capitol ainda estava relutante em promover o grupo, mas quando um DJ de Washington começou a tocar uma cópia importada de "I Want To Hold Your Hand", a aceitação foi esmagadora. Como as transmissões piratas do disco continuaram, a Capitol decidiu agilizar uma data para lançamento do single nos Estados Unidos, acompanhado por uma campanha promocional no valor de 50 mil dólares, dez vezes mais do que a gravadora já havia gasto com qualquer outro artista. Em 10 de janeiro de 1964, a tiragem inicial de 1 milhão de cópias de "I Want To Hold Your Hand" já estava esgotada, causando a rápida fabricação de uma nova prensagem.

Paul McCartney: Lançamos "From Me To You" - fracasso nos Estados Unidos. "She Loves You" - um grande sucesso na Inglaterra, número 1 - fracasso nos Estados Unidos. "Please Please Me" foi lançado por lá - fracasso. Nada aconteceu até "I Want To Hold Your Hand".

John Lennon (em 1970): Eu lembro quando encontramos o acorde que gerou a canção. Nós estávamos no porão da casa de Jane Asher, tocando juntos ao piano, e fizemos, "Oh, you-u-u/ Got that something". Aí Paul toca este acorde e eu viro pra ele e digo, "É isso! Toque de novo!" Naquele tempo nós realmente costumávamos compor daquela maneira - um tocando de frente para o outro.

Paul McCartney: Acho que o dinheiro (da Capitol) era gasto principalmente em Los Angeles, fazendo pessoas como Janet Leigh usarem perucas dos Beatles e serem fotografadas com elas, o que acabou iniciando a coisa toda. A partir do momento em que uma estrela de cinema fazia algo assim, isso seria noticiado por toda a América: "Olhem para esta foto engraçada; Janet Leigh com esta peruca doida - a peruca moptop." Então toda essa coisa de "moptop" começou por lá, e fez com que fôssemos notados.



18 de janeiro de 1964: Paris, França. Os Beatles estão há dois dias em uma maratona de dois, às vezes três, shows por dia no Olympia Theatre, que durará até 4 de fevereiro. Em sua suíte no hotel George V, o empresário Brian Epstein recebe um telegrama anunciando que as enormes vendas de "I Want To Hold Your Hand" levarão o single para a posição de número 1 na parada americana. Dois dias depois a notícia já é oficial, e repórters da imprensa americana voaram até Paris para entrevistar a banda que poucos deles haviam ouvido falar.

Paul McCartney: Uma noite nós voltamos ao hotel, quando um telegrama chegou para Brian, enviado pela Capitol Records da América. Ele entrou correndo no quarto dizendo, "Ei, olhem. Vocês estão em primeiro lugar nos Estados Unidos!' Bem, eu não posso descrever nossa reação. Mas foi assim, nós não acordamos durante uma semana.

Ringo Starr: Não conseguíamos acreditar. Nós começamos a agir como aquelas pessoas do Texas, gritando "Ya-hoo!'.

John Lennon: Parecia ridículo - quero dizer, a idéia de ter um disco de sucesso lá. Era algo que você simplesmente não podia imaginar. De qualquer jeito, era o que eu achava. Mas então eu pensei que se a garotada segue sempre a mesma coisa; e vendo o que fizemos na Inglaterra, não havia razão para não fazermos nos Estados Unidos também.

Brian Epstein: Nós sabíamos que os Estados Unidos podiam nos consagrar ou nos enterrar de vez como artistas. De fato, acabou nos consagrando.



7 de fevereiro: os Beatles ganham uma enorme despedida dos fãs ingleses no aeroporto de Heathrow, quando o avião 101 da Pan Am levanta vôo para o aeroporto John F. Kennedy, recentemente renomeado, em Nova York. 1:20 da tarde, o avião pousa para uma recepção ainda maior, organizada por cerca de 3 mil fãs americanos.

DJ americano Murray the K: O diretor da minha rádio disse-me que os Beatles estavam chegando. Eu disse, "Ótimo. Arranje um exterminador".*

*N.T. - A piada feita por Murray se refere ao trocadilho com o nome Beatles. Ele brincou, achando que os "Beetles" (besouros) estavam chegando. Daí a necessidade de um exterminador.

Ringo Starr: Foi muito emocionante. No avião, voando até o aeroporto, eu imaginei um grande polvo com tentáculos que puxavam o avião e nos trazia até Nova York.

Albert Maysles, realizador do documentário The First US Visit: Ninguém sabia se haveriam 50 ou 5 mil pessoas lá. Eu acredito que cinco ou dez mil apareceram no aeroporto. Após o assassinato de Kennedy, o país precisava de algo que levantasse sua moral, e estes caras acabaram se transformando nisso.

Murray the K: Na primeira entrevista coletiva, no aeroporto, de repente, George Harrison virou pra mim e disse, "Adoro seu chapéu". Parecia que eles haviam ouvindo falar de mim, pois todos os artistas que se apresentavam no Brooklin Fox Theater contavam a eles sobre meus programas quando estavam na Inglaterra, e tocavam meus discos para eles. Eles pararam com a coletiva e começaram a conversar comigo, para a fúria do resto dos jornalistas.

Os Beatles então fazem seu primeiro passeio de Cadillac, enquanto são levados ao New York's Plaza Hotel, onde ficarão no vigésimo andar, suítes presidenciais, para se prepararem para o Ed Sullivan Show - não sem antes ter problemas para atravessar o grande massa de fãs que cercavam o hotel, segurados por 100 policias novaiorquinos.

Paul McCartney: Eu lembro o grande momento em que entramos na limusine, ligamos o rádio e ouvimos comentários sobre nós. "Eles acabaram de deixar o aeropoto e estão nos arredores de New York City". Foi como um sonho. A maior de todas as fantasias.

Ringo Starr: Nós tínhamos estas enormes suítes no Plaza, com uma TV em cada quarto e rádios com fones de ouvido. Pra mim isto foi fascinante. Era uma coisa muito além, pois vínhamos da Inglaterra, onde tínhamos TV em nossas casas havia poucos anos.



8 de fevereiro: George está de cama com uma infecção na garganta, mas John, Paul e Ringo vão para outra coletiva, no Plaza, antes de uma sessão fotográfica no Central Park. Neil Aspinall, assistente dos Beatles, se posiciona no lugar de George nos ensaios para o Ed Sullivan Show, no Studio 50. Após os ensaios, Murray the K invade as suítes dos Beatles no Plaza.

Ringo Starr: A coisa que eu estava mais ciente quando fizemos o primeiro Ed Sullivan Show foi que ensaiamos a tarde inteira. A televisão tinha um equipamento de som tão ruim, que gravamos nossos ensaios e subimos até a sala de controle para regular a mesa de som. Nós ajustamos tudo com o engenheiro e então saímos para um descanso. Só que enquanto estávamos fora, a faxineira veio limpar a sala e a mesa de som. Ela deve ter pensado, "O que são todas essas marcas?", e limpou todas elas. Assim nossos planos foram por agua abaixo. Tivemos que nos apressar para ajustar o som.

Paul McCartney: Murray the K era o que mais estava envolvido com os Beatles; ele viu quando tudo surgiu e tomou controle da coisa. Nós estávamos muito impressionados e costumávamos telefonar para seu programa quando estava no ar. Ele podia falar sobre pessoas como Smokey Robinson, já que ele o conhecia. Smokey Robinson era como Deus para nós.



9 de fevereiro: os Beatles passam a tarde gravando o que seria sua terceira aparição no Ed Sullivan Show (transmitida em 23 de fevereiro). Então, as 8 da noite, para uma platéia de 728 adolescentes histéricos no Studio 50, Ed Sullivan apresenta a primeira aparição dos Beatles na TV, ao vivo, nos Estados Unidos. Eles tocam "All My Loving", "Till There Was You", "She Loves You", "I Saw Her Standing There" e "I Want To Hold Your Hand". Uma audiência recorde de 73 milhões de pessoas - 30 por cento da população dos Estados Unidos - assistiram a transmissão.

George Harrison (em 1995): Nós percebemos o quanto Ed Sullivan era grande porque ele recebeu um telegrama de Elvis e do Coronel.

Paul McCartney: Nós viemos do nada com aquele cabelo engraçado, parecendo marionetes ou algo assim. Aquilo foi muito influenciador. Eu acho que esse foi um dos principais fatores que nos fizeram diferentes - no início, o cabelo teve mais impacto do que a música. Muitos pais quiseram nos boicotar. Eles diziam aos filhos, "Não sejam bobos, eles estão usando perucas". Muitos deles conseguiram, mas muitas mães e crianças os fizeram voltar atrás. Essas crianças hoje estão crescidas e nos contam suas lembranças. É algo como, "Onde você estava quando Kennedy foi morto?" Eu vejo pessoas dizendo, "Oh, cara, eu lembro daquele domingo; nós não sabíamos o que tinha nos mordido".

Após o show, os Beatles festejaram na boate mais quente de Nova York, o Peppermint Lounge, enquanto Brian Epstein permaneceu no Plaza.

Albert Maysles: Eles tinham um senso de humor maravilhoso e também - as jovens da época podem dizer melhor do que eu - eram rapazes muito atraentes.



11 de fevereiro: Como uma pesada neve os impediu de voar, os Beatles pegaram um trem de Nova York até Washington DC, onde fariam seu primeiro concerto nos Estados Unidos, no Coliseum. 3 mil fãs já os esperavam na Union Station. Durante a viagem, os Beatles eram entrevistados e fotografados pela imprensa americana todo o tempo.

Ringo Starr: Bancar os caras legais salvou nossa pele em várias ocasiões, especialmente no trem até Washington, porque os caras da imprensa vieram para acabar conosco. Este repórtes, sendo de Nova York, gritavam com a gente, mas nós gritávamos de volta.

Murray the K: Eles impressionaram a todos porque nunca imitavam ou fingiam reagir da forma que os superstars sempre reagiam. Eles realmente conquistaram todo mundo daquele jeito.

Na chegada, os Beatles vão ao Shoreham Hotel, onde o sétimo andar inteiro estava reservado para eles - com exceção de apenas um quarto, ocupado por uma família que se recusou a mudar para outro. Enquanto os Beatles estão no Coliseum, o diretor assistênte do hotel "convence" a família a sair, cortando a luz, aquecimento e a água do quarto, e dizendo que uma queda de energia havia ocorrido no andar.

No Coliseum, os Beatles se apresentam durante meia hora para 8.092 fãs frenéticos, tocando "Roll Over Beethoven", "From Me To You", "I Saw Her Standing There", "This Boy", "All My Loving", "I Wanna Be Your Man', "Please Please Me", "Till There Was You", "She Loves You', "I Want To Hold Your Hand", "Twist And Shout" e "Long Tall Sally".

Albert Maysles: Não dava para ouvir grande parte dos shows, porque a gritaria era muito alta.

Após o show, os Beatles comparecem à uma recepção em sua homenagem na Embaixada Inglesa.

Ringo Starr: Nos início dos anos sessenta, ainda havia uma enorme disparidade entre gente do norte da Inglaterra e gente das embaixadas. Estávamos criculando e dizendo, "Olá, isto é muito legal", e tomando uma bebida, quando alguém veio por trás de mim e cortou um pedaço do meu cabelo, o que me deixou muito irritado. Por que ele estava com uma tesoura? Foi um incidente estúpido, querer cortar o cabelo de um Beatle.

Paul McCartney: Havia muitos riquinhos por lá, gente que nunca tínhamos visto.



12 de fevereiro: Os Beatles voltam a Nova York para serem a primeira banda de rock a se apresentar no Carnegie Hall, tocando períodos de 34 minutos, para uma platéia de 2.900 pessoas por show, "controladas" por cerca de 362 policiais. Entre os VIPs na platéia estava Lauren Bacall. Dividindo o show com os Beatles estava o grupo The Briarwoods. Houveram protestos do lado de fora do Carnegie Hall, promovidos pelos amantes da música clássica.



13 de fevereiro: O vôo número 11 da National Airline, com o piloto usando uma peruca beatle, leva os Beatles até Miami para sua segunda apresentação no Ed Sullivan Show. 7 mil fãs os recebem no Miami Internacional Hotel, acabando por causar um tumulto. O grupo se transfere para o Deauville Hotel, para uma suíte com 3 camas.

Murray the K: Cynthia Lennon estava com eles. Ela era casada com John na época. Paul dividiu o quarto com Ringo. George disse, "Ei, por que você não fica no meu quarto?" Então eu fui. Fiquei no quarto de George enquanto estávamos em Miami, e fiz meu programa direto dos quartos deles.

Paul McCartney: Miami era como um paraíso. Nós nunca havíamos estado em um lugar com palmeiras. Éramos realmente turistas; nós tínhamos nossas câmeras Pentax e tiramos um monte de fotografias.



16 de fevereiro: Os Beatles se apresentam ao vivo no Ed Sullivan Show, para uma platéia de 3.200 pessoas, tocando "She Loves You", "This Boy", "All My Loving", "I Saw Her Standing There', "From Me To You" e "I Want To Hold Your Hand". Depois tiraram um tempo para descansar.

Murray the K: Eu os levei para verem os Coasters. Eles preferiram ver os Coasters do que, digamos, Sammy Davis Jr. Eles queriam mesmo ver alguns astros do rock.

Ringo Starr: Este foi o lugar mais legal que já estive. As pessoas nos emprestavam iates, qualquer coisa que queríamos. Uma família nos emprestou sua lancha e me deixou pilotar. Era uma lancha de 60pés, um barco de corrida, e eu atraquei de frente, sem saber direito como pilotar. Ela tinha aqueles gradezinhas na frente e eu as destruí completamente. Eles não se importaram.

George Harrison: É claro que estávamos fazendo efeito, porque todas aquelas pessoas estavam implrando para nos conhecer - como Muhammad Ali, por exemplo.

Ringo Starr: Eu lutei com Cassius Clay, como ele era então chamado - Eu ensinei tudo a ele.



22 de fevereiro: Os Beatles voltam para Londres. A BBC interrompe sua programação esportiva de sábado para mostrar a multidão de 3.600 adolescentes que recebem o avião no aeroporto de Heathrow.

Paul McCartney: Toda a excitação daquela viagem não nos deixou surpresos, porque a grande coisa sobre nossa carreira era que ela tinha degraus. Se ficamos surpresos alguma vez, foi quando nos tornamos famosos no Cavern. Já quando estávamos fazendo shows como o do Peterborough Empire, levamos aquilo numa boa. Então fomos para os programas de televisão e para algumas rádios importantes, e arcamos com tudo aquilo também. Desta forma, os Estados Unidos eram mesmo uma progressão lógica.

George Harrison: Nós nos divertimos no início. Quando fomos pela primeira vez, havia a novidade da "conquista" da América. Depois voltamos naquele mesmo ano e fizemos uma turnê, e aí voltamos novamente no ano seguinte. Aí já era demais.

John Lennon: Eu sei que no avião eu estava pensando, "Oh, não vamos conseguir", mas este era apenas meu lado pessimista. Nós sabíamos que iríamos conquistá-los se tivéssemos a chance.

Albert Maysles: Os Beatles na época representavam a inocência e um tipo de cultura jovem que era pura, virginal.

Ringo Starr: Para minha família, não importava se agora tínhamos sucesso nos Estados Unidos. Já tínhamos sucesso em Liverpool e para eles já estava bom.









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